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AVESSOSÀs vezes a vida nos atira a coisas das quais não temos como fugir, como se não fôssemos capazes de guiar nossos próprios passos. Alguns chamam isso de destino.Minha mãe havia se tornado evangélica desde a morte de meu pai. Ela tentou superar a perda freqüentando a igreja. Eu já sabia muito sobre ele, pois era da mesma igreja que minha mãe. Ele foi criado pela avó, a chata e séria irmã Célia. Ela era sua avó paterna e ele havia perdido os pais em um acidente de carro. Minha mãe não cansava de nos comparar, falava o quanto ele era estudioso, inteligente e ligado à igreja.Curioso eu decidi ir à igreja para conhecê-lo. Talvez eu tenha me identificado com Emanuel, pois ele também não tinha o pai ao seu lado e, pior, uma mãe. Por mais chata que a minha fosse eu não conseguiria viver sem ela. Outra coisa: também éramos filhos únicos. Logo que chegamos à igreja minha mãe fez questão de nos apresentar. Sentamos todos juntos, não trocamos muitas palavras, pois não tínhamos nada em comum, ao contrário de minha mãe e sua avó.A banda da igreja começou a tocar uma música insuportável e tive a idéia de falar sobre ela com Emanuel. Sua avó às vezes me olhava, mas não falava nada, pois ela parecia não ter gostado de mim. Já minha mãe, a amargurada irmã Bárbara, parecia satisfeita por eu estar tentando ser amigo de Emanuel. Foi quando falei a ele sobre um violão que eu tinha, mas que não sabia tocar. Ele disse que sabia e pedi para que me ensinasse, o que seria a chance perfeita para ficar mais tempo próximo a ele. Emanuel disse que não era profissional e coisa e tal, mas eu insisti até convencê-lo. Sugeri que as aulas acontecessem na minha casa, com o que ele concordou.Minha mãe trabalhava como coordenadora em um colégio e passava a manhã e a tarde inteira fora. Na casa dele teríamos a presença da sua avó e da empregada da casa, mas eu queria ficar sozinho com Emanuel. Eu mesmo comuniquei sobre as aulas de violão a minha mãe e a sua avó, que perguntou se ele tinha tempo para me dar aulas, senão iria atrapalhar seus estudos. Porém ele respondeu que podia e minha mãe adorou a novidade: “quem sabe Emanuel consegue fazer você ver que a igreja é o melhor lugar para um jovem estar”.Aos poucos fui me aproximando mais dele e descobri que estudávamos no mesmo colégio particular, de cunho evangélico, no centro de Salvador, em séries diferentes, ele no segundo e eu no primeiro ano. Emanuel tinha dezesseis anos e eu, quinze. Nossos gostos musicais e literários também eram diferentes, e eu queria saber tudo sobre ele. Emanuel tinha cara de CDF e não era o tipo de garoto que me atraía, pois eu odiava garotos certinhos. Mas estava me interessando por ele.No começo foi difícil lidar com um desejo que parecia o pior do mundo e que me fazia mal. Quando via algum cara na TV eu ficava excitado, quando via algum garoto sem camisa ou o simples toque dele em mim. Meus pensamentos e fantasias envolviam sempre homens, e por mais que eu me masturbasse tentando pensar em meninas eu sempre terminava gozando quando pensava nos meninos. Passei a ler sobre o assunto na internet e a teclar com pessoas como eu em salas de bate papo, até que descobri que não era o único a ter esse desejo e que era normal o que eu estava sentindo, mesmo que para os outros isso fosse uma doença e um pecado abominável. Aos poucos fui conhecendo o mundo gls, os amigos, o sexo. O pior de tudo era não poder dizer “mãe, eu sou gay”, pois eu sabia que por mais que minha mãe me amasse ela nunca entenderia. Por isso meus namorados eram os melhores amigos da vez e minhas amigas minhas falsas namoradas.As aulas eram sempre à tarde, às quinze horas, e às vezes eu o convidava para almoçar comigo, mas raramente ele ia, porque ele e a avó sempre almoçavam juntos. Até para a igreja eu passei a ir para poder ficar perto dele, e estávamos nos tornando amigos. Mas eu queria algo mais, eu estava completamente apaixonado por Emanuel, sonhava com a chance de tê-lo um dia, no entanto não tinha coragem de me arriscar e perder o pouco que eu tinha dele.Em uma das aulas, enquanto Emanuel me passava uma nota o olhei profundamente nos seus olhos antes de perder o medo da reação dele perante um beijo, no qual eu revelaria toda a minha fragilidade perante os meus sentimentos por ele. O sexo não depende de sentimentos, pode acontecer entre dois estranhos, mas um beijo sincero só com pessoas que se gostam. Suavemente o encontro entre nossos lábios foi acontecendo, nossas línguas brincavam uma com a outra. Depois nos beijamos com mais voracidade, em um beijo prolongado. Emanuel se deixava entregar à luxúria reprimida e ao pecado.Revelei que estava apaixonado por ele, e ele me falou também havia sentindo algo por mim desde a primeira vez que me viu, mas tentava se controlar. Depois de tanto orar, jejuar, pedir oração sem revelar o motivo, é claro, porque era motivo de vergonha e desonra para ele, como cristão, para igreja e uma vergonha para Deus. Disse que tentou lutar contra, mas quando ficava perto de mim eu não resistia.Comecei a beijá-lo novamente, Emanuel me puxou para si, nos deitamos na cama e senti suas mãos percorrendo o meu corpo, enquanto eu o beijava. Tiramos nossas roupas, elas não serviam pra nada naquele momento, só pra atrapalhar. Ele me surpreendia, me dominando com suas mãos, com seus lábios, com a língua, com a boca. Suspirava de desejo e prazer intenso. Desci pelo seu corpo nu, fazendo um passeio com minha língua. Com meu sexo oral tentei lhe arrancar cada gota de prazer, até ser penetrado por ele, misturando dor com prazer, muito mais prazer, e, juntos, chegamos ao clímax.Depois tomamos banho juntos, passei o sabonete pelo corpo de Emanuel, lavando- o todo da cabeça aos pés, e ele fez o mesmo comigo. Depois voltamos para o meu quarto, onde ficamos alguns minutos deitados, abraçados. Estávamos felizes. Senti-me completo.As aulas passaram a ser apenas uma farsa que mantínhamos para os outros, porque curtíamos um ao outro a tarde inteira. Às vezes eu ia almoçar na sua casa, mas não gostava muito, pois eu sempre tinha a impressão de que a irmã Célia desconfiava de tudo, talvez fosse da minha cabeça. Às vezes íamos a lugares gls e eu apresentava o mundo gay a Emanuel, como haviam feito comigo. Mas eu evitava ir a esses lugares, onde a maioria não respeita ninguém. Assim, completamos dois meses e às vezes eu também ia à igreja aos domingos e aos sábados pra ficar perto dele, já que Emanuel não tinha coragem suficiente de sair da igreja e magoar a avó. Minha mãe estava adorando a minha suposta amizade com Emanuel, já da irmã Célia eu não podia dizer o mesmo. Emanuel dizia que ela achava que eu não era uma boa companhia para ele, que ele estava saindo muito e se afastando de Deus.Completamos dois meses de namoro, mas eu mentiria se dissesse que Emanuel era o meu primeiro amor. Mas ele era o mais importante, verdadeiro e mais forte amor que eu já havia sentido e experimentado. Eu sempre me apeguei fácil e, no final das contas, sempre me dava mal. Eu sabia que devia me afastar de Emanuel antes que eu estivesse dependente dele, mas não conseguia. Emanuel era diferente dos carinhas com quem eu estava acostumado a ficar, todos volúveis, com uma única coisa na cabeça: sexo. Não que eu não adorasse sexo, mas eu queria alguém que quisesse algo mais comigo, queria um amor verdadeiro.Às vezes eu escrevia cartas para ele. Certo dia eu terminava uma delas quando minha mãe me gritou pela milésima vez para eu ir à farmácia. Quando voltei encontrei minha mãe no meu quarto, chorando. Ela estava sentada na cama, segurando a carta que eu estava escrevendo para Emanuel e que eu havia esquecido em cima da cama. Os pais sempre sabem dos seus filhos, mas preferem fingir que não estão enxergando. Eu sabia que um dia todos saberiam da gente, pois tínhamos nossos sonhos e planos de um dia morarmos juntos e contar a verdade a nossa família. Mas ainda era cedo para eles descobrirem sobre a gente. Ela se levantou, com a carta na mão.- Eu tenho vergonha de você, João. Você é a pior desgraça da minha vida. Deus fez o homem para a mulher, endemoniado, corrompido por esse mundo sujo. Seu pai morreria de desgosto se estivesse vivo. E isso tudo dentro da minha casa, debaixo do meu teto.- Por favor, mãe, a senhora precisa me entender. Eu amo Emanuel. Não foi uma escolha ser gay, eu juro que não queria fazer a senhora sofrer. Se eu pudesse escolher eu não seria assim.- Um ladrão pode controlar a sua vontade de roubar, um viciado de se drogar e um homem perante o pecado da luxúria - retrucou minha mãe.De repente, enfurecida, ela começou a me esbofetear com fúria, dando-me várias tapas. A Bíblia não mandava amar o próximo como a si mesmo? Por que ela me tratava daquela forma? Não foi assim que Jesus havia agido com Madalena, não eram os princípios dele, que os evangélicos diziam seguir. Ela estava descontrolada. Eu tentava me proteger, mas ela só parou quando viu descer sangue pela minha boca, ao ferir meu lábio. Fiquei todo marcado.Passei o resto da noite trancado no quarto, chorando. No dia seguinte eu estava dormindo quando ela me acordou quase me jogando da cama.- João, eu preciso falar com você. Emanuel está aqui.Levantei-me para encarar a realidade, pois de nada adiantaria fugir dela. Decidi acompanhá-la e encontrei a Irmã Célia e Emanuel sentados no sofá. A Irmã estava com a carta na mão.- Diz pra irmã Célia o que acontece entre você e Emanuel.Emanuel não me olhava, eu parecia não estar ali para ele.- É desgosto demais, meu neto se envolver com um gay.Eu não pude me controlar ao ouvir a irmã Célia.- O seu neto também é gay, eu não o desencaminhei – disse, movido pela raiva.Os pais sempre acham que a culpa do filho ser algo que eles não achem adequado sempre é de alguém, mas Emanuel sabia muito bem o que estava fazendo. Todos sabem, mas era mais fácil para ela achar que eu era o gay e Emanuel o santo que eu tentava converter ao pecado.- Ele é tão gay quanto eu, se a senhora não sabe.O silêncio de Emanuel me dava mais ódio eu queria que ele falasse algo, queria alguma reação dele. Nem que fosse um olhar.Mas eu não via o amor nos seus olhos. Surpreendentemente, Emanuel se levantou do sofá, olhou-me com ódio e me deu um murro na barriga.Recuperei-me do soco e fui em sua direção, dando- lhe um soco também. Minha mãe e a irmã Célia vieram nos separar a irmã, e Célia caiu desfalecida no chão.Ficamos desesperados, Emanuel dizia que era minha culpa e minha mãe foi pedir ajuda a um vizinho. Ela voltou com ele e saíram com a irmã nos braços, levando-a para um hospital. Eu fiquei em casa, me sentindo culpado por tudo, pois, talvez, se eu não tivesse dito aquelas coisas para ela nada disso tivesse acontecido. Se ela morresse Emanuel jamais me perdoaria.Minha mãe não me ligou para dar noticias. Chegou horas depois e a única coisa que disse foi que eu não havia conseguido matar a irmã Célia, que tivera apenas uma queda pressão.Era difícil ver que tudo agora era um passado que me fazia lembrar frescamente de um amor perdido. O fim de tudo me apanhou mesmo antes de eu pensar na hipótese, como sempre acontecia. Seria lindo se tivéssemos vivido tudo aquilo que tínhamos sonhado.Eu estava dependente dele, preso a ele como nunca tinha estado a ninguém. E, como um viciado em drogas, não conseguia tirá-lo da minha mente. Era como se faltasse um pedaço de mim.Os dias foram passando e nos encontrávamos apenas no colégio e na igreja, que voltei a freqüentar só para pirraçá-lo e, ao mesmo tempo. Como Emanuel podia ser tão frio? O que custava a ele falar comigo? Eu sentia tanto a sua falta, às vezes chorava imaginando ele com outra pessoa. Eu estava angustiado, desmotivado e magoado. Sonhava com ele, imaginava milhares de situações e sentia imensa saudade de tudo que vinha dele: seu sorriso, sua pele...Faltavam poucos dias para completarmos um mês de separação. Eu não desistiria tão fácil de Emanuel, pois o amava mais que à minha própria vida. Eu precisava ter uma conversa definitiva com ele, tentar fazê-lo mudar de idéia e retomar o nosso namoro. Esperei-o na saída do colégio. E o implorei para que ele conversasse comigo, eu não merecia tanto desprezo, lhe prometir que depois daquela conversa o deixaria em paz. Ele aceitou e formos para minha casa.Eu disse que não conseguiria viver sem ele, que faria tudo para ninguém desconfiar de que estávamos juntos. Mais ele não queria, respondeu que era melhor ficamos afastados um do outro e que não queria correr o risco de fazer a avó sofrer. Ele esta com medo de viver o nosso amor, eu pensava ingenuamente. Mas não era isso ele depois ele acabou revelando que estava namorando um cara da sua igreja e deles a avó nunca desconfiaria. Prometir aceitar ser o outro mais ele não aceitou, ele outro que ele queria.É em Emanuel que eu penso quando choro sozinho. É o nome dele que a minha alma irá gritar quando eu estiver morto. Tenho vontade de morrer quando olho para trás e vejo esse amor. Hoje me sinto triste, mais triste que nunca, mais triste que ontem.Mas hoje decidi morrer. Minha mãe não está em casa, foi fazer uma visita a minha tia e só deve retornar à noite. Ainda é cedo, nem dez da manhã, e lá fora o Sol ilumina Salvador em mais um sábado ensolarado. Trancarei a porta do meu quarto e irei tomar vários remédios de que minha mãe faz uso, antidepressivos, entre outros que encontrei. Várias caixas guardadas, pois ela adora remédios. Decidi contar minha história para que vocês saibam o quanto eu amei, e para que você, Emanuel, tenha a certeza de que ninguém nunca vai amá-lo como eu. Essa é a maior prova do meu amor por você. Eu sempre estarei ao seu lado, porque as almas têm o poder de vagar por onde bem entenderem.FIM é o que espero. Que todos esses remédios me matem e que consumam todo o meu corpo, como o seu amor consumiu minha alma. Envio nossa história de amor a você, Emanuel, e a todos pelo meu e-mail. Adeus é o que eu espero. Quando você ler isto talvez eu esteja mais perto do que você imagina, porque é a ao seu lado que quero passar toda a eternidade
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5 comentários

João Roque disse... @ sexta-feira, 01 agosto, 2008

Muito bom texto; já o conhecia quando o publicaste no teu blog principal.
Abraço.

CÓDIGO SECRETO disse... @ sexta-feira, 01 agosto, 2008

Tambem gostei muito!!!
É bom demais navegar em letras bem
traçadas;

abraços

Anônimo disse... @ sexta-feira, 01 agosto, 2008

coloquei o conto aqui e vou recolocar no meu blog porque vou escrever a continuacao e eu estou preparando uma novelinha gls especialmnente para o codigo secreto

CÓDIGO SECRETO disse... @ sexta-feira, 01 agosto, 2008

Que bom teremos breve mais uma obra de nosso querido avessos;
E melhor ainda feita para esta Tribo.

O Código agradece!!!

paulo disse... @ sexta-feira, 01 agosto, 2008

muito bom! é daquelas histórias que prendem do princípio ao fim!

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